Walter Firmo no verbo do silêcio a sintese do grito

Walter Firmo incorporou desde cedo em sua prática fotográfica a noção da síntese narrativa de imagem única, elaborada por meio de imagens construídas, dirigidas e, muitas vezes, até encenadas. Desde o início de sua trajetória artística e profissional, confronta e questiona os cânones e os limites da fotografia documental e do fotojornalismo. Num sentido mais amplo, questiona a própria fotografia como mimese do real, incorporando em sua obra novos procedimentos criativos, específicos e conceituais, de valoração e exaltação do objeto e tema de interesse maior em seu percurso artístico: a representação e a visibilização da população negra do país.

Maria Helena - Diretora do Museu

Nascido e criado no subúrbio carioca, filho único de paraenses - seu pai, de família negra e ribeirinha do baixo Amazonas: sua mãe, de família branca portuguesa, nascida em Belém - Walter Firmo construiu, desde sua infância e adolescência, a poética de seu olhar voltada principalmente para a elaboração de um registro amplo e generoso da população negra do Rio de Janeiro e de todo o país, em sua vida cotidiana, seus afetos, suas religiosidades e suas festas. Uma verdadeira ode à integridade, altivez e resiliência dessa população e de suas múltiplas manifestações culturais.

Num processo próprio de construção de linguagem, experimentou e estabeleceu, já a partir do início dos anos 1960, um diálogo direto e inovador com nossa paisagem, população e luz - tropicais e transatlânticas, rurais e periféricas, sensuais e extasiantes. Sua fotografia foi sendo engendrada ao longo dos anos num verdadeiro estúdio a céu aberto, tendo como temática central não simplesmente a cor, mas uma cor que revela a população negra do país, tanto na potência cromática plena de suas imagens coloridas como também em suas poderosas imagens em preto e branco - a maior parte delas até hoje inéditas, mostradas pela primeira vez nesta exposição. Firmo construiu uma prática autoral, criativa e engajada, voltada para todos aqueles que descendem da violenta diáspora africana que marca e conforma inescapavelmente o passado, o presente e futuro deste país, tecendo e compondo "no verbo do silêncio a síntese do grito".

Negritude e encantamentos, narrativas e experimentações, são estes, portanto, os elementos estruturantes das múltiplas poéticas que conferem sentido e lugar a obra de Walter Firmo.

Carioca por nascimento. amazonense por ascendência, baiano por devoção, negro e brasileiro por definição e convicção. Walter Firmo nos apresenta nesta exposição sua obra densa e essencial, construída ao longo de uma trajetória de 70 anos ininterruptos, criando ao longo desse percurso, uma solida presença na imprensa e na fotografia autoral, que resultou em um vasto acervo de mais de 140 mil imagens, hoje preservado em regime de comodato no Instituto Moreira Salles. A exposição, inicialmente organizada e apresentada pelo IMS, em sua sede em São Paulo e posteriormente exibida no Rio de Janeiro, em Brasília e em Belo Horizonte, chega agora a Salvador por meio do generoso apoio e parceria do Museu de Arte Moderna da Bahia

Sergio Burgi, curador

Janaina Damaceno Gomes, curadora adjunta