Identidade cultural pode ser entendida como o resultado de um complexo processo social que faz com que os indivíduos desenvolvam o sentimento de pertencer a um grupo, comunidade, sociedade ou nação, envolvendo o compartilhamento de elementos como cosmovisão, religião, língua e costumes. A identidade cultural se expressa em níveis, indo da esfera individual, passando pela familiar, étnica, regional, até chegar ao nível macrogeográfico.
Esta sala expositiva pretende desconstruir a supervalorização do elemento étnico em relação aos outros níveis de identidade, pois há uma tendência à "tribalização" dos povos da África. A etnicidade, vista como o processo de manutenção das fronteiras sociais e a coesão dos indivíduos dentro do grupo, pode até mesmo nem ser expressa na cultura material. Os estudos etnoarqueológicos atuais mostram que a identidade cultural africana se evidencia principalmente nos níveis regional e familiar, mais do que no nível étnico. Assim, quatro regiões estilísticas são exibidas nesta sala para exemplificar essas questões.
Da região do Alto Volta estão expostas peças usadas pelos bobos, bwas e mossis, que são grupos étnicos vizinhos e aparentados que habitam desde tempos imemoriais o atual território do Burquina Faso e que possuem a economia baseada na agricultura de subsistência. Apesar de serem grupos étnicos diferentes, usam os mesmos tipos de máscaras zoomorfas em suas celebrações que pedem pela fartura nos campos.
No segundo agrupamento estão esculturas provenientes dos povos akan de Gana. O grupo akan compreende várias etnias aparentadas culturalmente, como os akan, achanti, fanti e bron. Por serem sociedades matrilineares, a rainha-mãe detinha grande poder político e visibilidade social. Isso se reflete na arte, pois as estatuetas que as representam eram colocadas em um aposento especial do palácio. Por conta do intenso comércio do ouro nessa região, os objetos que ficaram mais conhecidos dos povos akan são os contrapesos metálicos, que eram produzidos como instrumentos de medida para a pesagem do ouro. Peças como essas foram usadas por sociedades do grupo akan durante aproximadamente cinco séculos (1400 -1900).
Da Costa do Marfim (terceiro agrupamento aqui exposto) estão expostas máscaras e estatuetas provenientes dos grupos étnicos dan, senufo, baulê e guro. Apesar das diferenças culturais, é possível observar muitas semelhanças estilísticas na representação da figuração humana. Essas semelhanças morfológicas não são apenas resultado de parentesco cultural. Os baulês, por exemplo, são originários da região Akan, em Gana, mas migraram por volta de 1750. Eles se misturaram com as populações locais e acabaram construindo sua própria identidade, sendo que a arte que produzem atualmente é estilisticamente mais próxima dos senufos e dos guros, seus novos vizinhos na região central da Costa do Marfim.
No quarto agrupamento desta sala estão peças que ilustram a identidade em nível linguístico regional. Pesquisas apontam que há cerca de 4.000 anos houve ondas migratórias dos povos que ocupavam a região da divisa entre a Nigéria e Camarões para o sul e leste do continente, difundindo um substrato cultural por uma grande área que atualmente é denominada região banto. Dos povos Bantos, como os tchokwes, lubas, kubas e pendes que habitam o Congo e Angola, são exibidas máscaras que eram usadas nos rituais de passagem dos adolescentes e nas cerimônias fúnebres.
Para a Bahia, negros escravizados dessa região vieram em massa principalmente na fase do escravismo denominada "ciclo de Angola e Congo", que durou entre o final do século XVI e o final do século XVII. Hoje, a contribuição cultural dos bantos pode ser mais bem observada na etimologia do português brasileiro, na culinária e na religião. Em Salvador, o terreiro Manso Banduquenqué, localizado no bairro da Mata Escura, mais conhecido como Bate Folha, preserva a celebração do panteão de origem Banto e foi tombado pelo Iphan em 2003.
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